ÍNdice :
01. O DISCERNIMENTO DE ESPÍRITOS(20/07/06) 02. OS DONS ESPIRITUAIS E O FRUTO DO ESPÍRITO (20/07/06) 03. Livre-Arbítrio-Afinal,Temos Ou Não Temos?-Rev.Waldemar A.S.Filho (23/07/06) 04. MILAGRES E A RELIGIOSIDADE POPULAR 01. O DISCERNIMENTO DE ESPÍRITOS - por Orlando Rafael dos Santos “Pelo Espírito, a um é dada a palavra de sabedoria; ... a outro, discernimento de espíritos;” (I CO 12. 8,10). Discernimento, do verbo discernir (cujo sentido, no Dicionário, é conhecer, perceber distintamente, distinguir, discriminar bem). A Etimologia esclarece que o prefixo dis, de origem grega, significa dois. Numa Etimologia mais especulativa, separo o prefixo dis e tenho cernir, forma verbal que, substantivada, resulta em cerne, que, em sentido figurado, significa âmago, interior. Então, discernir seria ter a confirmação de uma verdade interior, inerente ao que esteja em questão, sejam fatos e suas causas ou pessoas e suas reais (secretas?) intenções. Essa confirmação, ao ser processada, torna-se dupla (olha aí o prefixo dis!), pela sua inerência à coisa em si e pela sua efetivação em nós como um conhecimento que passamos então a possuir. Em EZEQUIEL 44, lemos: “Mas os sacerdotes levíticos,... eles se chegarão a mim, para me servirem; e estarão diante de mim, para me oferecerem a gordura e o sangue, diz o Senhor Deus; eles entrarão no meu santuário, e se chegarão à minha mesa, pra me servirem, e guardarão a minha ordenança. Quando entrarem pelas portas do átrio interior, estarão vestidos de vestes de linho.” ... ...“E a meu povo ensinarão a distinguir entre o santo e o profano, e o farão discernir entre o impuro e o puro”. (EZ 44. 15, 16, 17, 23 – o grifo em negrito é meu) Na Carta aos HEBREUS, podemos ler: “Portanto, visto que temos um grande sumo sacerdote que adentrou os céus, Jesus, o Filho de Deus, apeguemo-nos com toda firmeza à fé que professamos, pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, mas sim alguém que, como nós, passou por todo tipo de tentação, porém, sem pecado. Assim, aproximemo-nos do trono da graça com toda a confiança, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça que nos ajude no momento da necessidade.” (HB 4. 14-16) Na condição de povo de Deus, aguardamos “a glória que em nós há de ser revelada” (RM 8.18). Embora ainda dispersos e espalhados por todo o planeta, já temos um único e definitivo Sumo Sacerdote, que, assim como os sacerdotes levíticos, foi constituído por Deus. Porém, o nosso Sumo Sacerdote, Jesus Cristo, não veio da descendência de Levi, e foi glorificado por Deus, como “sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque” (SL 110.4; HB 5. 6,10). Melquisedeque, que quer dizer rei de justiça, era rei de Salém (que significa paz – assim como shalom), e esta é Jerusalém (do hebraico Yerushalaim, habitação de paz), onde reinou Davi, de cuja descendência foi gerado Jesus Cristo, Rei da Justiça e Rei da Paz. Melquisedeque prefigura o Messias. Seria o próprio?!! E Jesus Cristo, como Sacerdote, ensina o povo de Deus a “discernir entre o puro e o impuro” (como em todo o Capítulo 13 de MATEUS, por ex.). E vai além: “Mas o Conselheiro, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, lhes ensinará todas as coisas e lhes fará lembrar tudo o que eu lhes disse” (JO 14. 26). No Livro dos ATOS DOS APÓSTOLOS está: “Enquanto Apolo estava em Corinto, Paulo, atravessando as regiões altas, chegou a Éfeso. Ali encontrou alguns discípulos e lhes perguntou: Vocês receberam o Espírito Santo quando creram? (AT 19. 1,2) (Em sua 3a. viagem missionária, o apóstolo Paulo, instruído pelo Espírito Santo, escreveu, de Éfeso, a I Carta à Igreja de Corinto, para instruir os seus membros acerca de dúvidas que os mesmos tinham quanto à doutrina cristã. E é nesta Carta que temos, no capítulo 12, a descrição dos Dons Espirituais, dentre os quais o dom de Discernimento de Espíritos, enfoque principal deste esboço.) A pergunta feita por Paulo cabe também a cada um de nós: “Você recebeu o Espírito Santo, quando aceitou Jesus como seu único e suficiente Salvador?” Fica a pergunta e cabe a sua lógica: Para termos acesso aos Dons Espirituais, os Dons do Espírito Santo, somente tendo-O em nós. Desta forma é que somos consagrados como “santuário do Espírito Santo” (I CO 6. 19). O DISCERNIMENTO DE ESPÍRITOS NO ANTIGO TESTAMENTO “Pois, que diz a Escritura? Creu Abraão a Deus, e isso lhe foi imputado como justiça.” (RM 4.3) E é com Abraão que ocorre, segundo percebo, um dos primeiros exemplos claros de Discernimento de Espíritos registrado na Bíblia: “Voltando Abrão da vitória sobre Quedorlaomer e sobre os reis que a ele se haviam aliado, o rei de Sodoma foi ao seu encontro no vale de Savé, isto é, o vale do Rei. Então Melquisedeque, rei de Salém e sacerdote do Deus Altíssimo, trouxe pão e vinho e abençoou Abrão, dizendo: “Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, Criador dos céus e da terra. E bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou seus inimigos em suas mãos. E Abrão lhe deu o dízimo de tudo”. O rei de Sodoma disse a Abrão: “Dê-me as pessoas e pode ficar com os bens”. Mas Abrão respondeu ao rei de Sodoma: “De mãos levantadas ao SENHOR, o Deus Altíssimo, Criador dos céus e da terra, juro que não aceitarei nada do que lhe pertence, nem mesmo um cordão ou uma correia de sandália, para que você jamais venha a dizer: Eu enriqueci Abrão.” (GENESIS 14. 17-23) Voltemos a ROMANOS: “Creu Abraão a Deus, e isso lhe foi imputado como justiça.” Porém, quando ele ainda era Abrão, recebeu a benção de Melquisedeque, em nome do “Deus Altíssimo, Criador dos céus e da terra”. E Abrão creu e reverenciou ao Deus Altíssimo, dando nas mãos do Seu Sacerdote (de uma ordem eterna, constituída pelo Senhor), “o dízimo de tudo”. Logo em seguida, o rei de Sodoma veio a Abrão e lhe ofereceu os despojos da guerra que havia sido travada, na qual Abrão saiu vitorioso. E como era Sodoma então? Em GENESIS 13.13 está dito: “Ora, os homens de Sodoma eram extremamente perversos e pecadores contra o Senhor”. Abrão não tinha parte com o rei de Sodoma, nem era seu aliado, e guerreara contra Quedorlaomer apenas para libertar Ló, seu sobrinho, que morava em Sodoma e fora levado prisioneiro para Elão, com todos os seus bens. Ao derrotar Quedorlaomer, Abrão livrou Sodoma, Gomorra, Admá, Zeboim e Belar de uma servidão de 14 anos. Diante do poderio demonstrado por Abrão, o rei de Sodoma saiu ao seu encontro, dispondo-se a abrir mão do que lhe havia sido tirado por Quedorlaomer, e que fora agora recuperado por Abrão, que declara: “não aceitarei nada do que lhe pertence...”. Ao agir assim, Abrão dá um exemplo de atitude-modelo para o crente: recusa tomar para si o que não lhe pertence, requisita a parte justa para os seus aliados (Aner, Escol e Manre), e dá uma lição a Bera, ímpio rei da ímpia Sodoma, evitando estabelecer vínculos com ele. Vimos, então, que, após Melquisedeque, sacerdote do Deus Altíssimo, haver abençoado Abrão, veio a este o rei de Sodoma, oferecendo-lhe os despojos da batalha, no que Abrão, com grande discernimento, recusou-se a aceitar. Cabe aqui lembrar do que está na I PEDRO 5.8: “...o diabo anda em derredor..., e procurando a quem possa tragar”. Assim como Abrão teve discernimento de que o Espírito de Deus era com Melquisedeque, e o reverenciou, também teve discernimento para recusar a partilha com o rei de Sodoma, o que estreitaria o laço entre eles. Com certeza, o espírito que havia com o rei de Sodoma era o mesmo que conduzia o seu povo à “perversidade e aos pecados contra o Senhor” (GENESIS 13.13). (Este breve estudo sobre o Discernimento de Espíritos, ocorreu a este autor após reflexão sobre I CO 12.31, que diz: “Entretanto, busquem com dedicação os melhores dons”). Orientado a buscar os melhores dons, refleti sobre o que poderia fazer um dom ser melhor do que outro, já que todos são atributos do Espírito Inalterável de Deus. Ocorreu-me, então, que, se no Espírito Santo não há variação, as há em nós. Então, o Maravilhoso Espírito de Deus, que é Fonte Inesgotável, nos conduz ao acesso àquele dom(ou dons) mais adequado(s) à nossa vida espiritual presente. Maiores passos poderão ser dados. Porém, isso dependerá da forma com a qual administremos as primícias de toda a graça que nos é concedida. Em I CO 14.12, podemos ler: “Assim também vós, já que estais desejosos de dons espirituais, procurai abundar neles para a edificação da igreja”. O verbo grego, aqui traduzido como abundar, que aparece 3 vezes na I Carta aos Coríntios e 39 vezes em todo o Novo Testamento, também pode ser traduzido como aumentar, exceder, e indica que o crescimento pode ser numérico (em vários dons) ou espiritual (no aprimoramento constante de um e/ou outro dom específico). (Uma observação: Mais de uma vez ouvi, entre membros da Igreja, que “o Espírito está sujeito aos profetas”. Examinando o versículo que trata desse assunto (I CO 14.32), encontro que “o espírito dos profetas está sujeito aos profetas”, o que é diferente das declarações ouvidas, que sempre me causaram estranheza, pois alteram e minimizam a soberania divina. Não cabe aqui estender o tema, citado apenas superficialmente, por estarmos enfocando a excelência da atuação do Espírito Santo de Deus em toda a Criação, a qual lhe é sujeita, e nada há que possa sujeitá-LO!) Conduzido pela palavra de Deus a buscar os melhores dons, sobreveio-me compreensão, dada pelo Senhor, da importância do dom de Discernimento de Espíritos para o momento atual da igreja, devido ao alcance maior e crescente que o Evangelho de Jesus Cristo tem logrado, e por haver interpretações equivocadas e parciais dos textos bíblicos, ocasionando distorções heréticas em doutrinas, em cultos e até em pregações, todos apresentados como “em nome de Jesus”. Contra isso, adverte-nos a Palavra Sagrada: “No passado surgiram falsos profetas no meio do povo, como também surgirão entre vocês falsos mestres. Estes introduzirão secretamente heresias destruidoras, chegando a negar o Soberano que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição. Muitos seguirão os caminhos vergonhosos desses homens e, por causa deles, será difamado o caminho da verdade.” (II PE 2. 1, 2) Para finalizar este breve ensaio, uma descrição do caminho que o dom de Discernimento de Espíritos poderia (pode!... deve!) percorrer em todos aqueles que o busquem: a) discernir, em nós próprios, se em todos os atos e escolhas pessoais estamos permitindo (e buscando, e pedindo!) que o Espírito Santo de Deus nos conduza e dirija; b) discernir se estamos permitindo que o Espírito Santo nos conduza na compreensão e na interpretação da palavra de Deus; c) discernir se o que temos feito, tanto material quanto espiritualmente, tem tido como tônica principal a edificação do corpo de Cristo; d) aí, então, poderemos almejar (e buscar!) o discernimento dos espíritos à nossa volta, tanto no nosso círculo mais íntimo (a família), como na congregação da qual somos parte, assim como em tudo o que vemos e ouvimos, através dos meios de comunicação e nas nossas eventuais (porém constantes) relações com o mundo não-cristão. Que permitamos que o Consolador nos seja por companhia constante ! Amém! 02 - OS DONS ESPIRITUAIS - por Orlando Rafael dos Santos Todo aquele que é alcançado pela redenção de Jesus Cristo e que abraça o Seu Evangelho, nova criatura é: as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo, como nos ensina II CO 5.17. Simão Pedro também ensina: Seu divino poder nos deu tudo de que necessitamos para a vida e para a piedade, por meio do pleno conhecimento daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude. Dessa maneira, ele nos deu as suas grandiosas e preciosas promessas, para que por elas vocês se tornassem participantes da natureza divina e fugissem da corrupção que há no mundo, causada pela cobiça. Por isso mesmo, empenhem-se para acrescentar à sua fé a virtude; à virtude o conhecimento; ao conhecimento o domínio próprio; ao domínio próprio a perseverança; à perseverança a piedade; à piedade a fraternidade; e à fraternidade o amor. Porque, se essas qualidades existirem e estiverem crescendo em sua vida, elas impedirão que vocês, no pleno conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo, sejam inoperantes e improdutivos. (II PE 1. 3-8) É significativo que dois apóstolos do porte de Pedro e Paulo tenham enumerado as qualidades ideais aos que acolheram o Evangelho em seu coração e por ele foram transformados. A profunda comunhão de ambos com o Espírito de Deus os capacitou a orientar-nos acerca das condições necessárias para que em nós habite, permanentemente, a presença divina, capacitando-nos, assim, a ser co-participantes da grande obra para a qual fomos chamados. Diz o apóstolo Paulo: Irmãos, quanto aos dons espirituais, não quero que vocês sejam ignorantes. Vocês sabem que, quando eram pagãos, de uma forma ou de outra eram fortemente atraídos e levados para os ídolos mudos. Por isso, eu lhes afirmo que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: “Jesus seja amaldiçoado”; e ninguém pode dizer: “Jesus é Senhor”, a não ser pelo Espírito Santo. Há diferentes tipos de dons, mas o Espírito é o mesmo. Há diferentes tipos de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. Há diferentes formas de atuação, mas é o mesmo Deus quem efetua tudo em todos. A cada um, porém, é dada a manifestação do Espírito, visando ao bem comum. Pelo Espírito, a um é dada a palavra de sabedoria; a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra de conhecimento; a outro, fé, pelo mesmo Espírito; a outro, dons de curar, pelo único Espírito; a outro, o poder para operar milagres; a outro, profecia; a outro, discernimento de espíritos; a outro, variedade de línguas; e ainda a outro, interpretação de línguas. Todas essas coisas, porém, são realizadas pelo mesmo e único Espírito, e ele as distribui individualmente, a cada um, como quer. (I CO 12. 1-11) Na seqüência do mesmo capítulo, dos versículos 12 ao 26, o Espírito nos conduz através de um brilhante texto acerca de unidade e comunhão. É aconselhável a leitura atenta dos Capítulos 12, 13 e 14 da I CORÍNTIOS, principalmente aos que já se conscientizaram de que aceitar a Cristo é muito mais do que apenas congregar em uma denominação. Ainda no Capítulo 12, da Carta aos Coríntios, dos versículos 27 ao 31, temos: Ora, vocês são o corpo de Cristo, e cada um de vocês, individualmente, é membro desse corpo. Assim, na igreja, Deus estabeleceu primeiramente apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mestres; depois os que realizam milagres, os que têm dons de curar, os que têm dom de prestar ajuda, os que têm dons de administração e os que falam diversas línguas. São todos apóstolos? São todos profetas? São todos mestres? Tem todos o dom de realizar milagres? Tem todos o dom de curar? Falam todos em línguas? Todos interpretam? Entretanto, busquem com dedicação os melhores dons. O Espírito Santo, através do ministério do apóstolo Paulo, conduz-nos ao conhecimento dos dons espirituais, enumerando-os. Vejamos agora a situação que originou a Epístola aos Coríntios, e busquemos nos fatos que ocorriam naquela Igreja a causa primeira dos ensinamentos então ministrados, o que, para todos os crentes, em todos os tempos, serve também como alerta. O Espírito de Deus, através da Sua palavra, sempre nos ensina a rejeitar os desvios e as distorções, dando-nos a Sua medida de justiça. CORINTO, A CIDADE Distante de Atenas uns 72 km, situava-se na entrada do estreito istmo que unia a península do Peloponeso ao continente. Na época de Paulo foi metrópole comercial e política da Grécia. Havia na cidade um templo para Apolo e outro para Afrodite, considerada pelos gregos a deusa do amor e da guerra. Havia prostituição no templo de Afrodite, como parte do culto que lhe prestavam os coríntios. A riqueza e a opulência da cidade fomentou nela a ostentação, o vício e a depravação. Os coríntios eram grandes polemistas, cheios de orgulho intelectual, assim como os atenienses, que, como todos os gregos, orgulhavam-se do alto grau de profundidade e de complexidade que alcançaram na Filosofia, nas Ciências, na Política e nas Artes. Comparados com alguns povos à sua volta, os gregos vivenciavam avanços que se provaram significativos para o estabelecimento e o desenvolvimento dos padrões que estabeleceram os conceitos de civilização que iriam influenciar o pensamento de todos os povos, até os dias atuais. Então, é fácil compreender o seu orgulho, ainda que nos seja inaceitável a sua soberba, a sua devassidão e a sua tendência ao culto politeísta e ao caráter licencioso dos seus rituais. O cunho investigativo do seu pensamento os levou a privilegiar a argumentação e a retórica, que, por si só, não edificam. Não conheciam eles a advertência de ECLESIASTES 12. 11, 12: As palavras dos sábios são como aguilhões, a coleção dos seus ditos como pregos bem fixados, provenientes do único Pastor. Cuidado, meu filho; nada acrescente a eles. Não há limites para a produção de livros, e estudar demais deixa exausto o corpo. A IGREJA DE CORINTO No início do capítulo 18 do Livro de Atos, lemos que Paulo chegou a Corinto, vindo de Atenas, e ali encontrou o judeu Áquila e sua mulher Priscila, vindos de Roma, de onde o imperador havia expulso todos os judeus. Lemos também que Paulo e Áquila exerciam o mesmo ofício, pois ambos fabricavam tendas, e é provável que as vendessem para o exército romano. Tinham, assim, uma aliança também profissional, garantindo o seu sustento. Havia uma sinagoga em Corinto, o que nos conta o versículo 4. Tal sinagoga era constituída também por gregos, além dos judeus, e ali Paulo debatia aos sábados. Junto com Timóteo e Silas, Paulo testificou aos judeus acerca de Cristo ser o Messias, os quais resistiram e blasfemaram. Então Paulo decidiu pregar aos gentios. Crispo, principal da sinagoga, creu com toda a sua família, e também muitos coríntios creram e foram batizados. Com eles Paulo ficou um ano e seis meses, discipulando-os. De Corinto, foram, Paulo, Áquila e Priscila para Éfeso, de onde Paulo partiu rumo a Cesaréia. Áquila e Priscila conheceram então Apolo, judeu de Alexandria, que conhecia somente o batismo de João. O casal, então, instruiu Apolo melhor acerca do caminho de Deus, tendo este judeu alexandrino se dirigido a Acaia (que era o nome que os romanos davam à Grécia), chegando a Corinto com cartas de apresentação dos crentes de Éfeso. Neste mesmo tempo, Paulo retornava a Éfeso e pregou aos discípulos acerca do Espírito Santo, pois os mesmos apenas conheciam o batismo de João. Impondo-lhes Paulo as mãos, foram batizados no Espírito Santo. Por dois anos ficou Paulo na região onde hoje é a Turquia, pregando Jesus tanto a judeus quanto a gregos. Como certamente havia vários equívocos de interpretação da verdade acerca do Caminho, Paulo, de Éfeso, durante a sua terceira viagem missionária, escreveu a I Epístola aos Coríntios, pois ouviu falar dos problemas que afetavam aquela igreja. Uma delegação da igreja coríntia visitou Paulo em Éfeso, pedindo-lhe conselhos. Também havia uma carta que os membros da igreja lhe enviaram, na qual expuseram suas dúvidas acerca de como seguir a verdade de Cristo. Temos, assim, um panorama resumido do contexto no qual o apóstolo Paulo escreveu aos coríntios. I CORÍNTIOS, Capítulo 12 – ACERCA DOS DONS ESPIRITUAIS OS DONS A palavra de sabedoria; A palavra de conhecimento; Fé; Dons de curar; Poder para operar milagres; Profecia; Discernimento de espíritos; Variedade de línguas; Interpretação de línguas. Em OS DONS DO ESPÍRITO SANTO (Editora Vida, 3a. edição, 1977), o autor, Gordon Chown, classifica os Dons em: Dons de Revelação, Dons de Poder e Dons de Inspiração. Então, ficamos assim, segundo a obra citada: DONS DE REVELAÇÃO A palavra do Conhecimento A palavra da sabedoria Discernimento de espíritos Ainda de acordo com Gordon Chown, esses DONS DE PODER dons são sobrenaturais no pleno sentido da Dons de curar palavra, enquanto o Fruto do Espírito, des- Operação de milagres crito em Gálatas 5. 22 e 23, é o desenvolvi- Fé mento, no âmago do homem, de qualidades Divinas paulatinamente adquiridas mediante DONS DE INSPIRAÇÃO a oração e a obediência, por pessoas que an- Variedade de línguas dam no Espírito e não segundo a carne. Capacidade de interpretar línguas Profecia Embora, quando falamos em dons espirituais, seja comum que citemos apenas os da I CORÍNTIOS 12, encontramos também os dons que se seguem no Novo Testamento: ROMANOS 12. 6-8: profecia, ministério, ensino, exortação, contribuição, liderança e misericórdia; EFÉSIOS 4. 11: apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres; I PEDRO 4.11: falar e servir (ministrar). A palavra dom vem do latim donum, que quer dizer dádiva, presente. É usada, do Antigo ao Novo Testamento, até RM 6.23, como dádiva, graça divina, presente da graça. A partir de RM 11.29, tem o sentido de capacitação (como também em CO 7.7; 12.4). Jesus disse: Quando vocês forem levados às sinagogas e diante dos governantes e das autoridades, não se preocupem com a forma pela qual se defenderão, ou com o que dirão, pois naquela hora o Espírito Santo lhes ensinará o que deverão dizer. LUCAS 12. 11.12 Não está aqui Jesus se referindo a um Dom do Espírito? Esse Dom não é a Palavra do Conhecimento? (E os cristãos, para estarem diante de poderosos, de governantes e de autoridades, dando testemunho da salvação, não necessitam ter a FÉ como Fruto e como Dom, a despeito dos riscos que possam correr?) REFERÊNCIAS BÍBLICAS DA APLICAÇÃO DOS DONS ESPIRITUAIS: 1) Palavra de Conhecimento: Antigo Testamento: II RS 6.9-12; Novo Testamento: JO 1.48. 2) Palavra de Sabedoria: Antigo Testamento: GN 41. 33-40; Novo Testamento: AT 9. 10-16. 3) Discernimento de Espíritos: Antigo Testamento: II RS 5. 20-27; Novo Testamento: AT 16. 16-18. 4) Dons de Curar: Antigo Testamento: II RS 5. 1-19; Novo Testamento: AT 9. 32-35. 5) Operação de Milagres: Antigo Testamento: EX 4. 1-17; 7. 1-25; Novo Testamento: AT 27. 1-44. 6) Fé: Antigo Testamento: NM 14. 6-9; Novo Testamento: AT 16. 25-34. 7) Variedade de Línguas: Novo Testamento: AT 19. 1-7. 8) Interpretação de Línguas: Novo Testamento: I CO 12. 10, 30; 14. 27. 9) Profecia: Antigo Testamento: EZ 12. 21-28; JL 2. 27-32; Novo Testamento: MAT 3. 11; AP 22. 10-21. OBS. Os textos bíblicos deste estudo são da BÍBLIA SAGRADA – Nova Versão Internacional. Como em muitas Igrejas são adotadas outras versões bíblicas, intentou o autor levar a todos que lerão este esboço, uma outra versão do texto sagrado, mais de acordo com a linguagem que usamos hoje em dia e não menos qualificada para a transmissão da Palavra da Verdade de Deus. Assim decidindo, julgamos acrescentar ao conhecimento que os irmãos têm do texto que é mais usado na própria congregação, a possibilidade de ampliação do entendimento da palavra do Senhor, pela variação, adequação e atualização de alguns termos e pela compreensão tornada possível pela recomposição de todo o fraseado. Cabe frisar, ainda, que constatamos que a maioria dos textos bíblicos aos quais temos tido acesso, é de altíssima qualidade literária, independente da época de cada versão (afinal, É A PALAVRA DE DEUS!); porém, este autor tem alcançado maior compreensão de certas passagens através da variedade de boas versões que me são apresentadas. Daí, então, a vontade de repartir, com todos quantos possa, todas estas possibilidades... B I B L I O G R A F I A 1) A BÍBLIA SAGRADA – Almeida Revisada de acordo com os melhores textos em hebraico e grego – Editora Hagnos –2002; 2) A BÍBLIA – Terra, História e Cultura dos Textos Sagrados – Volume II – John Rogerson –Edições del Prado – 1996; 3) A RAZÃO DA NOSSA ESPERANÇA – Deodor Taets – JUERP – 1999; 4) ATLAS GEOGRÁFICO ESCOLAR – Fename – 1957; 5) ATLAS HISTÓRICO BÁSICO – José Jobson de Arruda – Editora Ática = 1996; 6) BÍBLIA DE ESTUDO – Aplicação Pessoal – CPAD – 2004; 7) BÍBLIA DE ESTUDO PENTECOSTAL – CPAD – 2002; 8) BÍBLIA SAGRADA – Nova Versão Internacional – Editora Vida – 2001; 9) CHAVE LINGUÍSTICA DO NOVOTESTAMENTO GREGO – Fritz Rienecker e Cleon Rogers – Edições Vida Nova – 1995; 10) DICIONÁRIO TEOLÓGICO – Claudionor Correa de Andrade – CPAD – 1998; 11) ENCICLOPÉDIA COMPACTA DE CONHECIMENTOS GERAIS – Editora Três – 1995; 12) ESTUDO DE PARACLETOLOGIA ou DOUTRINA DO ESPÍRITO SANTO – Apostila – Missionária ZETT – SP: 13) GEOGRAFIA HISTÓRICA DO MUNDO BÍBLICO – Netta Kemp de Money – Editora Vida – 2003; 14) OS DONS DO ESPÍRITO SANTO – Gordon Chown – Editora Vida – 1977; 15) HISTÓRIA GERAL – Cláudio Vicentino – Editora Scipione – 1991; 16) HISTÓRIA PARA O ENSINO MÉDIO – Ricardo/Adhemar/Flávio – Editora Lê – 1998; 17) INTRODUÇÃO À TEOLOGIA SISTEMÁTICA – Millard J. Erickson – Edições Vida Nova – 1997; 18) LIÇÕES BÍBLICAS – Verdades Pentecostais - Revista CPAD – 1998; 19) LIÇÕES BÍBLICS – O Fruto do Espírito – Revista CPAD – 2005; 20) MINIDICIONÁRIO LUFT – Celso Pedro Luft – Editora Ática – 1996; 21) O BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO – R. Torrey – Editora Betânia – 1979; 22) UMA VIDA CHEIA DO ESPÍRITO – Charles G. Finney – Editora Betânia – 1980. O FRUTO DO ESPÍRITO
O capítulo cinco da epístola aos Gálatas (no qual Paulo tece importantes considerações acerca da Lei, enumera as obras da carne e descreve a composição do fruto do Espírito) inicia-se com uma declaração sobre a liberdade que passamos a ter em Cristo: “Foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permaneçam firmes e não se deixem submeter novamente a um jugo de escravidão. .................... “Irmãos, vocês foram chamados para a liberdade. Não usem a liberdade para dar ocasião à vontade da carne; ao contrário, sirvam uns aos outros mediante o amor. Toda a Lei se resume num só mandamento: “Ame o seu próximo como a si mesmo”. Mas se vocês se mordem e se devoram uns aos outros, cuidado para não se destruírem mutuamente. Por isso digo: Vivam pelo Espírito, e de modo nenhum satisfarão os desejos da carne. Pois a carne deseja o que é contrário ao Espírito; e o Espírito, o que é contrário à carne. Eles estão em conflito um com o outro, de modo que vocês não fazem o que desejam. Mas, se vocês são guiados pelo Espírito, não estão debaixo da Lei. .................... ...o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio. Contra essas coisas não há lei. .................... Se vivemos pelo Espírito, andemos também pelo Espírito. (GÁLATAS 5. 1, 13-18, 22, 25) Durante o ministério de Jesus, após ter Ele livrado a mulher adúltera dos escribas e fariseus (que, mesmo usando a Lei, distorciam a verdade – JOÃO, Capítulo 8), continuou no templo, ensinando ao povo e respondendo com sabedoria às perguntas capciosas com que os fariseus tentavam induzi-lo ao erro. Em uma das suas declarações de então, Jesus denuncia o uso carnal da Lei por parte dos fariseus: “Vós julgais segundo a carne; eu a ninguém julgo (JO 8.15)”. Aos judeus que, naquele momento, creram nEle, Jesus falou: “Se vós permanecerdes na minha palavra, verdadeiramente sois meus discípulos; e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará (JO 831, 32)”. Os judeus, então, ficaram surpresos, pois, como descendentes de Abraão, julgavam-se livres. Disse mais Jesus: “Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres (JO 8. 36)”. Por todos os 59 versículos do capítulo 8 do livro de João, Jesus disputa com os judeus, declarando a Sua condição de Messias, e muitos daqueles judeus não puderam crer nEle devido à carnalidade em que viviam e ao jugo com o qual estavam ligados à Lei, usando-a friamente, sem amor e sem misericórdia, em detrimento aos mandamentos da própria Lei (como em LV 19. 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, além de outros textos). Diferentemente de Maria, de Isabel, de João Batista, de Zacarias e de tantos outros contemporâneos de Jesus, não havia nestes outros judeus o Espírito que testificasse que estavam diante do Messias. As obras da carne operavam neles e, por isso, não podiam ter o discernimento espiritual necessário para que aceitassem a verdade das palavras de Jesus. Da mesma forma, quando Paulo escreveu às igrejas da Galácia, as defendia do jugo que lhes tentavam impor certos mestres judaicos, que defendiam a circuncisão e todos os ritos da lei judaica como requisitos necessários à salvação e ao ingresso na igreja. Foi o próprio Jesus que declarou: “Não pensem que vim abolir a Lei ou os Profetas; não vim abolir, mas cumprir. Digo-lhes a verdade: Enquanto existirem céus e terra, de forma alguma desaparecerá da Lei a menor letra ou o menor traço, até que tudo se cumpra. Todo aquele que desobedecer a um desses mandamentos, ainda que dos menores, e ensinar a outros a fazerem o mesmo, será chamado menor no Reino dos céus; mas todo aquele que praticar e ensinar estes mandamentos, será chamado grande no Reino dos céus. Pois eu lhes digo que se a justiça de vocês não for muito superior a dos fariseus e mestres da lei, de modo nenhum entrarão no Reino dos céus (MT. 5.17-20)”. Ao cumprir toda a Lei, Jesus libertou a humanidade do jugo do pecado e dos enganos, resgatando, em primeiro lugar, os judeus, as ovelhas perdidas da casa de Israel (MT 10.6), que não conseguiam cumpri-la integralmente. E trouxe a mesma liberdade aos gentios, a nós, que não nascemos judeus, mas que nEle cremos e buscamos conhecer a Sua Palavra, para a guardarmos em nossos corações e termos todo o nosso ser transformado. Esta é a condição necessária para que permaneçamos em Cristo e sejamos aprimorados no caminho que nos conduz à Sua glória. Amém! “Se vocês me amam, obedecerão aos meus mandamentos. E eu pedirei ao Pai, e ele lhes dará outro Conselheiro (Consolador) para estar com vocês para sempre, o Espírito da verdade. O mundo não pode recebe-lo, porque não o vê nem o conhece. Mas vocês o conhecem, pois ele vive com vocês e estará em vocês. Não os deixarei órfãos; voltarei para vocês (JO 14.15-18)”. Através das palavras acima, Jesus nos garante continuar conosco, na pessoa do Espírito Santo, ensinando-nos a permanecer no Seu amor e na Sua justiça, justificados que estamos “mediante a fé (ROMANOS, capítulo 5)”. Tendo em nós o Espírito Santo de Deus, temos também assegurado o cumprimento da Lei, cujo preço foi pago por Jesus; o Espírito Santo, em nós, nos “ensinará todas as coisas e lhes fará lembrar tudo o que eu lhes disse. Deixo-lhes a paz; a minha paz lhes dou. Não a dou como o mundo a dá. Não se perturbe o seu coração, nem tenham medo (JO 14. 26, 27)”. Que grande promessa! Jesus nos deixa a Sua paz, que é a presença do próprio Espírito Santo em nós, guiando-nos e orientando-nos para que prossigamos firmes no rumo da salvação! Só esta declaração já bastaria para quebrar a resistência dos que não crêem que Jesus Cristo seja Deus, dos que duvidam da Sua autoridade divina. Tal declaração seria altamente herética, se não partisse do Único que detém toda a autoridade para proferi-la; e não há outra de teor igual ou de teor aproximado, dentre as proferidas por todos os que se posicionam como líderes “espirituais” e são, apenas, pretensos condutores de crenças não-cristãs. Se os próprios judeus, detentores da Lei desde a sua instituição, os quais tiveram contato direto com o SENHOR, precisaram (precisam!) permitirem-se serem transformados pela renovação do seu próprio entendimento (RM 12.2), mais ainda nós, os gentios, que viemos, durante incontáveis gerações, no desconhecimento do Criador e no não-reconhecimento da Sua soberania. É então que nos vem a pergunta de Paulo: “Vocês receberam o Espírito Santo quando (ou depois que) creram? (AT 19.2) Podemos substituir a palavra receberam por outras, tais como: recepcionaram, quiseram, pediram. Então, a pergunta de Paulo ficaria assim: “Vocês recepcionaram o Espírito Santo quando creram?”; Ou: “Vocês quiseram o Espírito Santo quando creram em Jesus Cristo?”; Ou ainda: “Vocês pediram ao Espírito Santo que lhes viesse e habitasse, quando creram e aceitaram Jesus Cristo como único e suficiente Salvador ? Entendemos, de acordo com a palavra de Deus, que a fé em Jesus Cristo nos purifica de toda a raiz pecaminosa, e que isso se deve pelo mover do Espírito Santo em nossas vidas, purificando-nos de todas as mazelas com as quais antes co-existíamos; porém, o apóstolo Paulo nos conclama a buscar uma intimidade bem maior com o Espírito Santo de Deus, reconhecendo o seu ministério junto a nós e consagrando-Lhe voluntariamente a nossa vida, pois o Espírito Santo Consolador nos foi enviado por Jesus Cristo, que declarou: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Paio amará, e viremos a ele e faremos nele morada (JO 14.23)”. Ao desejarmos a presença do Espírito Santo em nós, recebemos o próprio Jesus: “...e quem me recebe a mim, recebe aquele que me enviou (MT 10. 40b)”. Diz-nos o apóstolo Paulo: “... pois o Filho de Deus, Jesus Cristo, pregado entre vocês por mim... não foi “sim”e “não”, mas nele sempre houve “sim”. Por isso, por meio dele, o “Ämém” é pronunciado por nós para a glória de Deus. Ora, é Deus que faz que nós e vocês permaneçamos firmes em Cristo. Ele nos ungiu, nos selou como sua propriedade e pôs o seu Espírito em nossos corações como garantia do que está por vir (II CO 1. 19-22)”. A ALEGRIA Com esta compreensão, “aproximemo-nos do trono da graça com toda a confiança, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça que nos ajude no momento da necessidade (HB 4. 16)”. E são tantas as necessidades! O nosso próprio aprimoramento espiritual é a nossa principal necessidade, pois há muito em cada um de nós que precisa ser vencido e transformado, em etapas gradativas e constantes. Necessitamos ser aplicados, “para sermos cheios do pleno conhecimento da vontade de Deus, com toda a sabedoria e entendimento espiritual. E isso para que vivamos de maneira digna do Senhor e em tudo possamos agradá-lo, frutificando em toda a boa obra, crescendo no conhecimento de Deus e sendo fortalecidos com todo o poder, de acordo com a força da sua glória, para que tenhamos toda a perseverança e paciência com alegria, dando graças ao Pai, que nos tornou dignos de participar da herança dos santos no reino da luz (CL 1. 10-12)”. E essa aplicação só nos é possível se tivermos o Espírito Santo nos conduzindo, se quisermos ser também nEle batizados, para, então, termos condição de resistir a toda a carnalidade que há em nós e nos envolve, afetando as fraquezas do nosso corpo perecível (que em nós milita contra a salvação). Somente plenificados pelo Espírito Santo de Deus podemos cumprir fielmente os desígnios do Senhor para as nossas vidas. Para combatermos os causadores de todo o mal (que são satanás e os seus asseclas), os quais, em seus últimos estertores de perdedores (já foram condenados eternamente) se empenham para que um grande número de almas se perca, somente se tivermos em nós o Espírito Santo, não apenas para a remoção dos antigos pecados, mas também para nos capacitar para a permanente batalha espiritual, travada sem trégua, contra a nossa própria natureza carnal e contra todos os espíritos de perdição que se levantam para impedir o caminho dos fiéis e a conversão dos ímpios. E, ao buscarmos o Espírito Santo, temos os nove itens do Fruto do Espírito para nos servirem de medida, e assim avaliarmos o quanto estamos permitindo que o Espírito habite em nós em toda a Sua plenitude: AMOR, ALEGRIA, PAZ, PACIÊNCIA, AMABILIDADE, BONDADE, FIDELIDADE, MANSIDÃO e DOMÍNIO PRÓPRIO. Este é o Fruto do Espírito! Esta é a medida da nossa busca, os crentes que queremos ser completamente transformados pelo Senhor, uma vez que a nossa fé já nos tem conduzido à presença do trono da graça de Deus, através do reconhecimento de que o sacrifício de Jesus possibilitou uma nova aliança nossa com o Criador, alcançados que fomos pelo Seu infinito e imensurável Amor. A ALEGRIA Para enfatizarmos um dos nove itens do Fruto do Espírito, escolhemos a ALEGRIA, sobre a qual passaremos a discorrer. No Dicionário, alegria é contentamento, satisfação, jovialidade, vivacidade, júbilo, além de outras definições menos importantes para esta reflexão. Na Chave Lingüística do Novo Testamento Grego, temos que fruto é aquilo que é produzido pelo esclarecimento; no caso do fruto do Espírito, somos esclarecidos pelo Espírito Santo. Também temos, na obra citada, que alegria é aquela fundamentada num relacionamento consistente com Deus. No empenho para a compreensão do vocábulo alegria, como está no texto de Gálatas, auferimos que o mesmo chegou a nós através do latim al-acer (vivo, vivaz), adotando a forma alegria no espanhol, tendo daí chegado ao português. Não conseguimos, ainda, rastrear o caminho anterior traçado pelo vocábulo, até a sua chegada às línguas européias, porém já sabemos que a grande maioria dos prefixos formados por al tem a sua origem em el, este originado diretamente das formações lingüísticas do Oriente Médio. Podemos, então, intuir prováveis caminhos traçados pela palavra alegria, se levarmos em conta a época em que a carta aos Gálatas foi escrita, o povo para o qual foi a mesma escrita, a extensa cultura do missivista, a grande miscelânea lingüística promovida pela expansão do Império Romano e a capacitação concedida pelo Espírito Santo, para que o termo usado fosse esclareceder, tanto para aqueles para os quais a carta foi primeiro endereçada, quanto para nós próprios, e para tantos outros, cada grupo vivendo em épocas diferentes e sob diferentes condições de entendimento, quer sociais, quer individuais. Sabedores de que “o Senhor vela pela Sua palavra, para a cumprir (JR 1.12)”, ficamos cientes de que, salvo grosseiras e heréticas distorções da palavra de Deus, as quais têm surgido ao longo dos tempos, as versões honestas contam com o auxílio precioso do Espírito Santo de Deus, conduzindo tradutores, lingüistas e intérpretes para que cada versão tenha o sentido ideal para edificação daquele que crê. ALEGRIA – as diversas traduções: Do original grego chara, alegria. Do latim al-acer, vivo, vivaz; alacritas, vivacidade (donde o francês alacrité, alegria) Na versão em português – da Vulgata, alegria. - da versão Almeida, gozo. - Da Nova Versão Internacional, alegria. Na versão espanhola – Reina-Valera, Revisión 1995, gozo. Na versão inglesa – da Authorized (King James) Version, joy. - da Contemporary English Version, happiness. Na versão francesa – traduite d’après les textes originaux hébreu et grec, joie. Ainda acerca da alegria, como um dos itens do fruto do Espírito, trascrevemos a seguir um texto de Catherine Marshall, americana da Virginia, extraído do seu belo livro O Consolador, escrito em 1977, editado no Brasil pela Editora Betânia, primeira edição de 1979, com tradução de Myrian Thalita Lins: ALEGRIA - “Tendo recebido a palavra, posto que em meio de muita tribulação, com alegria do Espírito Santo... vos tornastes o modelo... (I TS 1. 6,7)”. A alegria é um dos frutos do Espírito a nós prometido (GL 5.22). Todavia, é provável que alguns não tenham compreendido bem esta palavra. Podemos pensar em alegria como na exultação por orações milagrosamente respondidas; na felicidade de uma vida mansa mediante as bênçãos de Deus; ou na euforia emocional dos cânticos e júbilo do povo de deus em comunhão revigorante. Embora Deus freqüentemente nos conceda essas bênçãos, a alegria do Espírito é algo mais profundo. A promessa não é que o cristão viverá apenas em circunstâncias propícias, mas eu o Consolador nos dá o dom sobrenatural da alegria em quaisquer situações. Podemos ver o efeito disto na narrativa e Lucas sobre a recém-nascida igreja. Aqueles primeiros cristãos tinham muitos problemas! Depois do Pentecoste, logo após Pedro ter pregado seu segundo sermão, ele e João foram presos (AT 4. 3). A seguir, um grupo de apóstolos foi aprisionado e açoitado (AT 5. 18-40), e Estevão foi apedrejado até a morte (AT 7. 58-60). Os cristãos foram perseguidos e enxotados de suas casas (AT 8.3). Tiago, tido por alguns estudiosos como meio-irmão do Senhor, foi decapitado (AT 12.2). Pedro foi aprisionado por Herodes, que tencionava executa-lo (AT 12. 3,4). E assim por diante. Todavia, em meio a tudo isto, o relato de Atos está salpicado de declarações sobre o júbilo irreprimível desses primeiros cristãos... “Dividiam seus alimentos com alegria”...Estavam constantemente “louvando a Deus”... “E os discípulos estavam cheios de júbilo e do Espírito Santo”. Enquanto observamos Paulo e Silas sendo presos em Filipos, recebendo “muitos açoites”e sendo depois lançados no cárcere com os pés no tronco, vemos com grande surpresa a alegria do Consolador presidindo a esta situação: “Por volta da meia-noite, Paulo e Silas oravam e cantavam louvores, e os demais companheiros de prisão escutavam...” (AT 26. 25). Aqueles outros prisioneiros devem ter ouvido com incredulidade, pois não há nada natural em orar e louvar com os pés presos no tronco. A alegria genuína em tais circunstâncias é evidentemente impossível para nós, seres humanos; trata-se claramente de algo sobrenatural. Jesus, porém, nunca nos prometeu um dom de alegria humana, enviado a nós como um pacote. Pelo contrário, sua promessa foi esta: “Tenho-vos dito estas coisas para que o meu gozo esteja em vós, e o vosso gozo seja completo.”(JO 15.11). A promessa é de que receberemos a alegria do próprio Jesus. Mediante o Espírito,o Senhor ressurreto e glorificado habitará em nosso coração frio, e com ele virá a sua alegria. BIBLIOGRAFIA 1. A BÍBLIA SAGRADA – Almeida revisada do hebraico e grego – Hagnos Editora – 2002; 2. BÍBLIA DE ESTUDO – Aplicação Pessoal – CPAD – 1995; 3. BÍBLIA DE ESTUDO PENTECOSTAL – CPAD – 1995; 4. BÍBLIA SAGRADA – Edição dos Missionários Capuchinhos – Lisboa – Stampley Pub.- 1974; 5. BÍBLIA SAGRADA –Nova Versão Internacional- Editora Vida – 2001; 6. CHAVE LINGUÍSTICA DONOVO TESTAMENTO GREGO – Ed. Vida Nova – 2000; 7. DICIONÁRIODE AFIXOS E DESINÊNCIAS – Carlos Góis – Ed. Autor – 1946; 8. DICIONÁRIO BRASILEIROCONTEMPORÂNEO – Fco. Fernandes – Ed. Globo – 1967; 9. DICIONÁRIO FRANCÊS-PORTUGUÊS – MEC – 1961; 10. DICTIONAIRE DES RACINES DES LANGUES EUROPÉENNES – Larousse- Paris- 1948; 11. HOLY BIBLE – Contemporary English Version – American Bible Ssociety – 1995; 12. LA SAINTE BIBLE – Traduite par Louis Second (1910) – ABU – Édition revue; 13. MINIDICIONÁRIO LUFT – Editora Ática – 1996; 14. THE NEW TESTAMENT – Authorized (King James) Version – The Gideons Int.- 1988; 15. O CONSOLADOR – Catherine Marshall – Editora Betânia – 1979; 16. SANTA BIBLIA – Reina Valera – Sociedades Bíblicas Unidas – Revisión 1995. Autor _ Orlando Rafael dos Santos (Recebido no uniaonet.com , em 21/07/2006 ) 03. Livre-Arbítrio-Afinal,Temos Ou Não
Temos?-Rev.Waldemar A.S.Filho
Introdução Neste estudo, iremos procurar entender a questão que envolve o termo “Livre-arbítrio”. Trata-se de um tema que trouxe grande discussão
durante alguns períodos da História. O entendimento diferente acerca
deste tema, ou seja a defesa da existência de um “livre-arbítrio” ou
a sua negação, tem divido pessoas até hoje.
Mas, afinal temos ou não temos livre-arbítrio?
É isto mesmo que iremos verificar, não só analisando as posições teológicas
acerca do assunto, mas, buscando luz da Bíblia para clarear nosso entendimento.
Antes de mais nada precisamos definir o que
seja esse tal “Livre-arbítrio”:
1. Livre-arbítrio
“Livre-arbítrio”, tem sido definido, como
a capacidade dada ao homem, por ocasião de sua criação, para escolher
entre o bem e o mal, entre agradar a Deus ou desobedecê-Lo. Seria o
“livre poder de eleger o bem ou o mal”.[2]
Héber Carlos de Campos também a define como
tendo sido a capacidade que o homem teve, “de escolher as coisas que
combinavam com a sua natureza santa, mas que, mutavelmente, pudesse
escolher aquilo que era contrário à sua natureza santa”.[3]
Vejam que tais definições, estão de acordo
com o que prescreve a nossa Confissão de Fé:
O homem em seu estado de inocência , tinha
a liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável
a Deus, mas mudavelmente, de sorte que pudesse decair dessa liberdade
e poder.[4]
É importante dizermos que quanto a definição,não existe dificuldade.O proble-ma todo que envolve o tema, é se o homem hoje, depois da queda , possui ou não esse tal de livre-arbítrio. Antes mesmo de entrar propriamente na discussão,
se o homem ainda dispõe dessa capacidade, precisamos dizer algo acerca
de uma faculdade natural e inalterada no homem, mesmo depois da queda,
chamada de “livre agência” ou “capacidade de escolha”.
2. Livre Agência ou Capacidade de Escolha
Existe no homem uma capacidade tal que lhe
dá condições de fazer escolhas, de acordo com o que lhe é agradável.
O homem sempre e em qualquer condição, faz as suas escolhas, de tal
forma que ele é responsabilizado por elas. “Essa capacidade ou aptidão
é um aspecto inalienável da natureza humana normal”.[5] Ele é livre
para escolher o que lhe agrada, de acordo com suas inclinações.
Sobre este aspecto da existência humana a
CFW diz o seguinte:
Deus dotou a vontade do homem com tal liberdade
natural, que ela nem é forçada para o bem nem para o mal, nem a isso
determinada por qualquer necessidade absoluta de sua natureza. Ref.
Tiago 1:14; Deut. 30:19; João 5:40; Mat. 17:12; At.7:51; Tiago 4:7.[6]
Comentando acerca desta seção da CFW, A.
A. Hodge diz o seguinte:
...que a alma humana, inclusive todos os
seus instintos, idéias, juízos, emoções e tendências, tem o poder de
decidir por si mesma; isto é, a alma decide em cada caso como geralmente
lhe agrade.[7]
O homem é livre para escolher,sendo que nada
externamente pode forçar suas escolhas. Isto é essencial no homem,
faz parte da sua criação a imagem e se-melhança de Deus. “À parte dela,
não pode haver qualquer responsabilidade, confiança ou planejamento.
À parte dela, não pode haver educação, religião ou adoração. À parte
dela, não pode haver qualquer arte, ciência ou cultura. A ca-pacidade
de escolher é uma condição sine qua non de toda a vida humana”.[8]
A definição de Campos sobre este assunto
é também esclarecedora:
Livre Agência, por outro lado, poderia ser
definida como a capacidade que todos os seres racionais têm de agir
espontaneamente, sem serem coagidos de fora, a caminharem para
qualquer lado, fazendo o que querem e o que lhes agrada, sendo, contudo,
levados a fazer aquilo que combina com a natureza deles.[9]
Campos ainda falando sobre este aspecto,
enfatizando a responsabilidade humana em suas escolhas diz:
É importante que o ser racional que ele aja
sempre movido pelo seu ego. A responsabilidade dele sempre estará diretamente
ligada à voluntariedade do seu ato. Todos os atos dele devem ser auto-inclinados
e auto-determinados.
Portanto, para que haja responsabilidade,
não é necessário que haja o poder de escolha contrária, mas sim, que
haja o poder de auto-determinação, que a ação seja nascida nas inclinações
do ser racional.[10]
Pelo que ficou demonstrado, em qualquer época
o homem é livre para agir conforme sua condição, sua natureza, ou seja,
ele sempre faz o que quer conforme a sua inclinação.
3. A queda do homem: O que aconteceu ao livre-arbítrio?
Como dissemos acima, na criação o homem recebeu
a capacidade de fazer escolhas e possuía também a liberdade de
fazer escolhas certas, ou seja podia escolher agradar a Deus, de tal
forma que pudesse cair desse estado em que foi criado. O homem foi criado
totalmente santo, integro, contudo podia escolher algo que fosse contrário
a essa sua natureza. E foi isso o que aconteceu, ou seja, escolheu pecar.
“No princípio, portanto, o homem não era um ser neutro, nem bom nem
mau, mas um ser bom que era capaz de, com a ajuda de Deus, viver uma
vida totalmente agradável a Deus”.[11] Como dizia Agostinho, o homem
tinha a “capacidade de não pecar” (posse non peccare).[12]
Neste sentido, até antes de sua queda podemos
dizer, o homem possuía o livre-arbítrio, contudo com a desobediência,
ele perdeu tal capacidade, sendo que não mais consegue fazer escolhas
certas, não consegue agradar a Deus. Suas escolhas serão sempre determinadas
pelo estado em que caiu. Suas escolhas serão de acordo com a sua natureza.
É neste ponto que surgem então discussões,
pois, diferente da posição Reformada Calvinista, os Arminianos irão
afirmar que o homem ainda possui o livre-arbítrio. Ele pode sem
a intervenção de Deus, em seu estado natural, fazer escolhas espirituais
acertadas.
Para os arminianos a queda do homem, embora
tenha trazido algum prejuízo não afetou totalmente o homem, sendo que,
continua em seu estado natural a ter habilidades para escolher a salvação,
para escolher agradar a Deus. Desta forma, a depravação não foi total.
Vejam mais detalhadamente a posição dos arminianos[13]
quanto a depravação do homem:
Embora a natureza humana tenha sido seriamente
afetada pela queda, o homem não ficou reduzido a um estado de incapacidade
total. Deus, graciosamente, capacita todo e qualquer pecador a arrepender-se
e crer, mas o faz sem interferir na liberdade do homem. Todo pecador
possui uma vontade livre (livre arbítrio), e seu destino eterno depende
do modo como ele usa esse livre arbítrio. A liberdade do homem consiste
em sua habilidade de escolher entre o bem e o mal, em assuntos espirituais.
Sua vontade não está escravizada pela sua natureza pecaminosa.. O pecador
tem o poder de cooperar com o Espírito de Deus e ser regenerado ou resistir
à graça de Deus e perecer. O pecador perdido precisa da assistência
do Espírito, mas não precisa ser regenerado pelo Espírito antes de poder
crer, pois a fé é um ato deliberado do homem e precede o novo nascimento.
A fé é o dom do pecador a Deus, é a contribuição do homem para a salvação.[14]
O ensino arminiano segue o raciocínio
de Pelágio, com diferença apenas no fato de que este, dizia que a queda
não afetou em nada a humanidade, de tal forma que “o homem continua
nascendo na mesma condição em que Adão estava antes da queda. Esta isento
não só de culpa, como também de polução.”[15] Por isso, os arminianos
são considerados semi-pelagianos, pois pensam que o homem depois da
queda tenha capacidade para fazer escolhas certas.
Os reformados calvinistas, em contra partida,
afirmam que a queda incapacitou totalmente o homem, afetando todas
as suas faculdades. O homem após a queda perdeu tal liberdade, sendo
agora escravo do pecado, morto espiritualmente.
Vejam mais detalhadamente o pensamento calvinista
sobre a depravação total
Devido à queda, o homem é incapaz de, por
si mesmo, crer de modo salvador no Evangelho. O pecador está morto,
cego e surdo para as coisas de Deus. Seu coração é enganoso e desesperadamente
corrupto. Sua vontade não é livre, pois está escravizada à sua natureza
má; por isso ele não irá - e não poderá jamais - escolher o bem e não
o mal em assuntos espirituais. Por conseguinte, é preciso mais do que
simples assistência do Espírito para se trazer um pecador a Cristo.
É preciso a regeneração, pela qual o Espírito vivifica o pecador e lhe
dá uma nova natureza. A fé não é algo que o homem dá (contribui) para
a salvação, mas é ela própria parte do dom divino da salvação. É o dom
de Deus para o pecador e não o dom do pecador para Deus.[16]
Os calvinistas neste sentido, seguem os ensinos
de Agostinho, que por sua vez combateu os ensinamentos de Pelágio. Agostinho
ensinou que quando os seres humanos “pecaram, embora não perdessem a
sua capacidade de fazer escolhas, perderam a sua capacidade de
servir a Deus sem o pecado – em outras palavras, a sua verdadeira liberdade.
O homem tornou-se, então, um escarvo do pecado; ele passou ao estado
de ‘não ser capaz de não pecar’ (non posse non peccare).”[17]
A CFW afirma o seguinte acerca disso:
O homem, caindo em um estado de pecado, perdeu
totalmente todo o poder de vontade quanto a qualquer bem espiritual
que acompanhe a salvação, de sorte que um homem natural, inteiramente
adverso a esse bem e morto no pecado, é incapaz de, pelo seu próprio
poder, converter-se ou mesmo preparar-se para isso. Ref. Rom. 5:6 e
8:7-8; João 15:5; Rom. 3:9-10, 12, 23; Ef.2:1, 5; Col. 2:13; João 6:44,
65; I Cor. 2:14; Tito 3:3-5.[18]
Calvino também disse o seguinte acerca desta
situação do homem:
As Escrituras atestam que o homem é escravo
do pecado; o que significa que seu espírito é tão estranho à justiça
de Deus que não concebe, deseja, nem empreende coisa alguma que não
seja má, perversa, iníqua e impura; pois o coração, completamente cheio
do veneno do pecado, não pode produzir senão os frutos do pecado.[19]
O homem, após a queda não possui mais o livre-arbítrio,
não pode mais escolher algo que é contrário a sua natureza pecaminosa.
Ele está morto, cego, é escravo do pecado.
Esta doutrina defendida pelos calvinistas,
pelos reformados, que por sua vez é negada pelos arminianos, não se
trata apenas de uma posição teológica diferente, e sim de afirmação
bíblica. Nega-la é o mesmo que renunciar a Palavra de Deus neste assunto.
São inúmeros os textos que afirmam tal verdade,
falando que o homem está incapacitado totalmente de atender ao
convite de salvação, de atender as exigências divinas. Isto acontece
por seu próprio pecado, por sua própria inclinação e desejo. À parte
da graça de Deus o homem, por sua própria iniciativa não pode salvar-se,
ou escolher isto.
Vejamos textos que servem de base para a
doutrina calvinista:
1. O homem
está morto, incapaz de qualquer bem, precisando da intervenção divina:
Jr 13.23; Ef. 2.1-10; Rm 3.9-18, 23; Cl 2.13; Tt 3.3-5.
2. O homem
não consegue ir até Jesus, senão com a ajuda somente de Deus: Jo 6.44,
65; Rm 9.16.
3. O homem
precisa nascer de novo, contudo, isto só aconteça através da atuação
do Espírito Santo, que age soberanamente: Jo 3.1-15.
4. O homem
não pode compreender as coisas espirituais, senão pelo Espírito: I Co
2.14-16.
5. A Bíblia
declara que o homem está cego, é escarvo do pecado. Não pode fazer outra
coisa senão pecar, a não ser que Deus mude seu estado: Ef. 4.18; Jo
8.31-36; Jo 9.35-41; Rm 6.15-23; 2 Tm 2.26.
6. O homem
não pode apresentar um fruto diferente daquilo que ele é: Mt 7.16-18;
Tg 1.16-18.
Percebam que, afirmar que o homem tem o livre-arbítrio,
é o mesmo que ignorar tais textos da Bíblia.
É importante enfatizar que, o homem mesmo
neste estado, continua ser um agente livre, ou seja, ele exerce “a livre
agência”. Isto quer dizer que continua a fazer as suas escolhas, contudo,
não escolhe nada que seja contrário a sua natureza pecaminosa (Jo 5.40;
Tg 1.14; Mt 17.12; At 7.51; Ef 2.3). O homem nunca é forçado a fazer
algo que não deseja. Faz sempre aquilo que lhe traz prazer.
Sobre isto, diz Calvino:
Não pensemos, entretanto, que o homem peca
como que impelido por uma necessidade incontrolável; pois peca com o
consentimento de sua própria vontade continuamente e segundo sua inclinação.
Mas, visto que, por causa da corrupção de seu coração, odeia profundamente
a justiça de Deus; e, por outro lado, atrai para si toda sorte de maldade,
por isso afirmamos que não tem o livre poder de eleger o bem ou o mal
– que é o que chamamos livre-arbítrio.[20]
Campos diz também o mesmo:
Originalmente, antes da queda, o homem teve
tanto o livre arbítrio como a livre agência. Depois da queda o homem
ficou somente com a livre agência, pois perdeu tanto o desejo quanto
a capacidade de fazer o bem, isto é, o poder de agir contrariamente
à sua natureza.[21]
Assim, é o homem quem escolhe continuar no
pecado, contudo, não tem capacidade, por causa do seu próprio pecado
e maldade, para escolher coisa diferente a não ser que suas inclinações
e vontade sejam transformadas por Deus, recebendo habilidade para escolher
o que é bom e reto. Por isso o homem é sempre responsabilizado por seus
atos, pois, sempre escolhe o que lhe agrada.
4. Na Redenção do Homem: O que acontece ao
livre-arbítrio?
Quando Deus em sua livre graça, resolvendo
salvar o homem, age em seu coração, pela ação do Espirito lhe implanta
vida, o que acontece é que o homem recebe habilidade para escolher o
que é reto e bom. A Bíblia descreve este ato, como o da libertação de
um escravo, dando-lhe liberdade para escolher o que é agradável a Deus,
contudo, muito embora liberto, pode ainda inclinar-se para o pecado.
O homem passa a desejar o que é bom. Isto não significa que não deseje
o pecado, pois, ainda permanece nele a imperfeição.
Sobre isto diz a CFW:
Quando Deus converte um pecador e o transfere
para o estado de graça, ele o liberta da sua natural escravidão ao pecado
e, somente pela sua graça, o habilita a querer e fazer com toda a liberdade
o que é espiritualmente bom, mas isso de tal modo que, por causa da
corrupção, ainda nele existente, o pecador não faz o bem perfeitamente,
nem deseja somente o que é bom, mas também o que é mau. Ref. Col.1:
13; João 8:34, 36; Fil. 2:13; Rom. 6:18, 22; Gal.5:17; Rom. 7:15, 21-23;
I João 1:8, 10.[22]
Estaria o homem regenerado na mesma condição
de Adão antes da queda, ou seja, teria ele agora novamente o livre-arbítrio?
Não, pois, não voltamos a ser como era Adão. Ele era perfeitamente reto,
santo, e podia escolher algo que fosse contrário ao que era a sua natureza.
O homem regenerado, recebe liberdade para escolher o que é bom, contudo,
não tem o livre arbítrio, pois não escolhe algo contrário ao que ele
é. Ou seja, quando escolhe o que é bom, faz isso de acordo com a sua
nova natureza criada em Cristo e quando escolhe pecar, faz isso, conforme
a sua natureza carnal. Esta é a luta que reside dentro do homem
restaurado. Ele não pode dar lugar ao velho homem (Ef 4.17-24;
Cl 3.1-11).
É importante ressaltar que, sendo regenerado
o homem recebe habilidade, que antes não tinha, para escolher a Deus.
Conforme Agostinho, o homem recebe a capacidade de não pecar (posse
non peccare).[23] Por isso, e somente assim, pode atender ao convite
do Evangelho para a sua salvação. O homem na regeneração, continua a
exercer a sua “livre agência”.
Vejam como a CFW, fala da condição que o
homem para fazer escolhas espirituais, como um ser ativo:
Todos aqueles que Deus predestinou para a
vida, e só esses, é ele servido, no tempo por ele determinado e aceito,
chamar eficazmente pela sua palavra e pelo seu Espírito, tirando-os
por Jesus Cristo daquele estado de pecado e morte em que estão por natureza,
e transpondo-os para a graça e salvação. Isto ele o faz, iluminando
os seus entendimentos espiritualmente a fim de compreenderem as coisas
de Deus para a salvação, tirando-lhes os seus corações de pedra e dando
lhes corações de carne, renovando as suas vontades e determinando-as
pela sua onipotência para aquilo que é bom e atraindo-os eficazmente
a Jesus Cristo, mas de maneira que eles vêm mui livremente, sendo para
isso dispostos pela sua graça. Ref. João 15:16; At. 13:48; Rom. 8:28-30
e 11:7; Ef. 1:5,10; I Tess. 5:9; 11 Tess. 2:13-14; IICor.3:3,6; Tiago
1:18; I Cor. 2:12; Rom. 5:2; II Tim. 1:9-10; At. 26:18; I Cor. 2:10,
12: Ef. 1:17-18; II Cor. 4:6; Ezeq. 36:26, e 11:19; Deut. 30:6; João
3:5; Gal. 6:15; Tito 3:5; I Ped. 1:23; João 6:44-45; Sal. 90;3; João
9:3; João6:37; Mat. 11:28; Apoc. 22:17.
Esta vocação eficaz é só da livre e especial
graça de Deus e não provem de qualquer coisa prevista no homem; na vocação
o homem é inteiramente passivo, até que, vivificado e renovado pelo
Espírito Santo, fica habilitado a corresponder a ela e a receber a graça
nela oferecida e comunicada.
Ref. II Tim. 1:9; Tito 3:4-5; Rom. 9:11;
I Cor. 2:14; Rom. 8:7-9; Ef. 2:5; João 6:37; Ezeq. 36:27; João5:25.
[24]
É o homem que diz sim a Deus, que diz sim
ao chamado do Evangelho, depois de Ter sido habilitado, libertado do
pecado. O abrir do olhos, a nova criação, o nascer de novo, é obra da
livre graça de Deus e se não for assim, ninguém poderá crer em Cristo.
Se não recebermos a fé que vem do Senhor, nunca poderemos crer. Maravilhosa
graça!
5. Na glorificação do Homem: Terá o livre-arbítrio?
Quando formos glorificados, por ocasião da
vinda de Cristo e completação de nossa salvação, teremos de volta o
livre-arbítrio? Não, na glorificação, não voltaremos a ser como Adão,
estaremos à frente dele, pois, ele quando criado não gozava de uma perfeição
permanente, ou seja, podia cair de tal estado. Ele podia escolher algo
contrário a sua natureza, contudo, se tivesse sido obediente poderia
Ter alcançado a perfeição permanente. Os crente glorificados alcançarão
o que Adão não pode alcançar. Teremos perfeita liberdade para servir
a Deus. Continuaremos a ser agentes livres, pois, escolheremos o que
estará de acordo com a nossa natureza perfeita. Nunca escolheremos pecar,
pois, não haverá tal possibilidade, então, nunca mais teremos o livre-arbítrio.
Desta forma, como disse Agostinho, alcançaremos
o estado “não posso pecar” (non posse peccare).[25]
Diz a CFW:
É no estado de glória que a vontade do homem
se torna perfeita e imutavelmente livre para o bem só. Ref. Ef. 4:13;
Judas, 24; I João 3:2.[26]
Comentando a CFW, Hodge diz:
Quanto ao estado dos homens glorificados
no céu, nossa Confissão ensina que continuam, como antes, agentes livres;
contudo, os restos de suas velhas tendências morais corruptas, sendo
extirpadas para sempre, e as graciosas disposições implantadas na regeneração,
sendo aperfeiçoadas, e o homem todo, sendo conduzido à medida da estatura
do varão perfeito, à semelhança da humanidade glorifica de Cristo, permanecem
para sempre perfeitamente livres e imutavelmente dispostos à perfeita
santidade. Adão era santo e instável. Os homens não regenerados são
impuros e estáveis; isto é, são permanentes na impureza. Os homens regenerados
possuem duas tendências morais opostas, digladiando-se pelo domínio
em seus corações. São lançadas entre elas, contudo a tendência graciosamente
implantada gradualmente por fim prevalece perfeitamente. Os homens glorificados
são santos e estáveis. São todos livres e, portanto, responsáveis.[27]
Portanto na glorificação, seremos para sempre
livres, sem também o livre-arbítrio para sempre.
Conclusão
Os reformados, os calvinistas crêem no livre-arbítrio, como tendo sido uma habilidade concedida a Adão e perdida na queda. Desde então o homem ficou desprovido de qualquer habilidade para fazer escolhas santas, agradáveis a Deus. Não lhe resta outro desejo senão o de pecar, conforme as inclinações de seu próprio coração, sendo assim, um agente livre e responsável. Cremos que, nunca mais tal habilidade fará
parte da existência humana. O fato de Deus nos libertar do pecado nos
habilitando a fazer escolhas acertadas, não é o mesmo que dizer que
temos o livre-arbítrio. As escolhas sempre estarão de acordo com a nossa
natureza, ou naturezas.
Nem antes, nem depois, voltaremos a ser como
era Adão. Na glorificação estaremos à frente dele, num estado em que
o pecado não será possível.
Dizermos que existe um tal de livre-arbítrio,
seria o mesmo que dizer que Deus não é soberano sobre a salvação do
pecador, que Ele está sujeito ao querer do homem.
Se não fosse Deus, sua graça o que seria
de nós, nunca escolheríamos a Ele.
Que o estudo acerca desse tema, possa-nos
motivar a glorificar a Deus por causa da sua graça que, agindo em nós
mudou nos inclinações e vontade, fazendo-nos querer, desejar, o que
não queríamos nem desejávamos.
Sola Gratia! Soli Deo Gloria!
[1] Estudo apresentado na 2ª Igreja Presbiteriana
de Juiz de Fora em 29/03/2003.
[2] Juan Calvino, Breve Instruccion Cristiana,
Felire, Barcelona, pg. 13.
[3] Héber Carlos de Campos, Antropologia
Bíblica, Apostila, JMC, São Paulo, pg.9.
[3] CFW, IX, II.
[5] Anthony Hoekema , Criados a Imagem de
Deus, CEP, São Paulo, 1999, pg. 252.
[6] CFW, IX, I.
[7] A. A. Hodge, Confissão de Fé de Westminster
Comentada, Os Puritanos, 1999, pg. 220.
[8] Hoekema, pg. 253.
[9] Campos, pg. 10.
[10] Idem.
[11] Hoekema, pg. 255.
[12] Citado por Hoekema, pg. 255.
[13] O nome “arminiano”, se aplica aos seguidores
de James Arminius (um professor de seminário holandês), que, em
1610 apresentaram um protesto ao “Estado da Holanda”, “um ano após a
morte de seu líder. O protesto consistia de ‘cinco artigos de
fé’, baseados nos ensinos de Armínio, e ficou conhecido na história
como a ‘Remonstrance’, ou seja, ‘O Protesto’. O partido arminiano insistia
que os símbolos oficiais de doutrina das Igrejas da Holanda (Confissão
Belga e Catecismo de Heidelberg) fossem mudados para se conformar com
os pontos de vista doutrinários contidos no Protesto. As doutrinas às
quais os arminianos fizeram objeção eram as relacionadas com a soberania
divina, a inabilidade humana, a eleição incondicional ou predestinação,
a redenção particular (ou expiação limitada), a graça irresistível (chamada
eficaz) e a perseverança dos santos. Essas são doutrinas ensinadas nesses
símbolos da Igreja Holandesa, e os arminianos queriam que elas fossem
revistas.” Estas informações forma citadas da tradução livre e adaptada
do livro The Five Points of Calvinism - Defined, Defended, Documented,
de David N. Steele e Curtis C. Thomas, Partes I e II, [Presbyterian
& Reformed Publishing Co, Phillipsburg, NJ, USA.], feita por João
Alves dos Santos.
[14] Idem.
[15] Louis Berkhof, A História das Doutrinas
Cristãs, PES, São Paulo, pg. 120.
[16] A formulação de tais idéias, foram apresentadas
pelos calvinistas combatendo as idéias arminianas, apresentas no protesto
ao Estado da Holanda. Tais idéias fazem parte do conhecido, “Os Cinco
Pontos do Calvinismo”.
[17] Hoekema, pg. 255.
[18] CFW, IX, III.
[19] Citação extraída de Paulo Anglada, As
Doutrinas da Graça, Puritanos, 2000, pg. 17.
[20] Idem.
[21] Campos, pg. 11
[22] CFW, IX, IV.
[23] Citação extraída de Hoekema, pg. 258.
[24] CFW, capítulo X; I, II, Da Vocação Eficaz.
[25] Hoekema, pg. 267.
[26] CFW, IX; V.
Por: Rev. Waldemar Alves da Silva Filho (Via_Geraldo
em 23/07/06)
04. MILAGRES E A RELIGIOSIDADE POPULAR
_ Rev. Ashbell Simonton Rédua (recebido
em 28/07/06)
Geralmente se pensa que o problema dos
milagres tenha interesse puramente teológico e religioso. Isso tem
levado vários intérpretes a considerar a discusão de milagres como
algo que só tem significado no contexto da crítica psicologica à teologia
e à religião. A questão dos milagres tem alto interesse epistemológico
no campo da teologia e isto parece algo indiscutível.
Grandes correntes da teologia Cristã contemporânea
afirmam que só faz sentido falar de Deus como um Deus que age e se
revela na história - um Deus que se faz conhecido, através de eventos
históricos. Embora esta ação divina seja vista, principalmente por
teólogos de tendências existencialistas, na dimensão existencial do
curso normal e natural da história e também da teologia natural, por
outros é vista primariamente nos portentos e prodígios que se crê
que Deus tenha realizado milagres como sinais divinos para o seu povo.
Esta é uma questão, porém, que não nos interessará diretamente neste
artigo.
O problema de milagres tem ramificações
epistemológicas de razoável interesse para a filosofia e ciência,
e são estas ramificações que nos interessarão mais de perto em nossa
análise dos milagres e da religiosidade popular.
Não há dúvida de que o nosso interesse
principal ao discorrer sobre milagres na religiosidade popular é solaptar
o que era considerado como uma das mais fortes evidências a favor
da veracidade da religião Cristã, a saber, o suposto fato de haver
ela surgido em meio a magníficos milagres. Contudo, não recorreremos
à estratégia de outros anti-apologetas do cristianismo, qual seja,
mostrar que milagres não podem ter ocorrido, pois são "impossíveis".
Nosso principal argumento é que, mesmo que milagres sejam possíveis,
e ainda que tenham realmente ocorrido, uma pessoa sábia e instruída
(ou racional), cujas crenças são proporcionais à evidência existente
para estas crenças, nunca terá razões suficientemente fortes para
acreditar que tenham ocorrido. Em outras palavras, milagres não são
impossíveis: são meramente "incríveis".
MILAGRES COMO VIOLAÇÃO DAS LEIS DA NATUREZA
O fato dos milagres ter sido escolhido
como estratégia de vários grupos religiosos cristãos e não-cristãos,
é, de certa maneira, indicativo de sua preferência por problemas relacionados
ao ser humano a problemas relacionados à natureza, de sua afeição
maior pela cura miragulosa, do que pela ciência natural.
A analise do processo histórico do
movimento carismático tanto evangélico como católico romano de libertação/cura
tornou-se nos últimos vinte anos, um fenômeno religioso que unificaria
as crenças populares com os conceitos religiosos das classes populares,
em busca da libertação da opressão política, econômica, social e da
religiosidade tradicional.
Como movimento popular, o movimento carismático
elabora os mais diversos símbolos e praticas devocionais que se identifica
com as necessidades básicas do homem latino-americano.
No movimento è identificado três práticas
principais que irão caracterizar as suas ações:
1º) A Bíblia tem vital importância, porém
não há uma preocupação acadêmica na sua interpretação, consequentemente
a hermenêutica e a exegese são irrelevantes, o importante mesmo è
a interpretação literal, neste caso o “crero profissional” não existe
no movimento.
2º) Torna-se imprescindível o ministério
do leigo, ele è a mola mestre para o crescimento do movimento. O leigo
tem participação ativa no processo de conversão, por não ter formação
acadêmica religiosa, o clérico é uma pessoa do povo, necessariamente
carismático, que seguiu todos os passos propedêuticos do movimento:
batismo com o Espírito Santo, dom de línguas (estática e não glossolalia),
exerceu o ministério leigo de evangelização e discipulado, passou
pelo diaconato e presbiterato. O clérico é um ancião no sentido literal
da palavra.
3º) É identificado um universo simbólico
que legitima o movimento, os principais são o batismo com o Espírito
Santo e o dom de línguas. Estes símbolos por sua vez tornaram-se a
porta de entrada dos salvos na comunicação e comunhão com Deus.
Na praticidade a religiosidade popular
a partir do povo nem sempre são coerentes, devido ao surgimento de
lideranças ideológicas partidárias que com a bandeira de Deus decretam
uma “batalha espiritual”, contra todas as demais denominações e seitas
cristãs e/ou não cristãs, contribuindo para a formação de um estruturalismo
sincrético, adquirindo formas históricas e sociológicas diferentes
em momentos e lugares distintos.
Praticamente todo o movimento religioso
popular, possuem características de seitas, até aqueles grupos que
são classificados estruturalmente em denominações (Assembléia de Deus,
Congregação Cristã, Brasil para Cristo, Igreja do Evangelho Quadrangular,
Comunidade Evangélica da Graça, Igreja do Nazareno, Universal
do Reino de Deus, Católicos Carismático, Igreja Católica Brasileira,
etc.), radicalizam-se, assumindo formas sectárias e revolucionárias
contra os demais grupos religiosos.
A PRÀTICA RELIGIOSA
DO MOVIMENTO POPULAR
Vivemos em um país de crise que também
é perceptível em toda a América Latina. São diversos os
fatores que contribuem para esta crise: è o atendimento médico governamental
precário, são os planos de saúde inacessíveis a grande maioria
da população, è a poluição sonoro, è a presença de químicos
que mata lentamente o povo, é a insegurança social, econômica e política,
è o medo e pavor de assaltos, è a falta de saneamento básico para
a maioria da população, è o problema da falta de moradia digna
para o povo, è o problema do menor abandonado, è a tristeza
daqueles que moram nos lixões das grandes cidades, è a questão da
prostituição infantil, è a evidência da corrupção pública, è o consumo
de drogas, è a falta de uma política séria, honesta, que visa o bem
estar da população, è a perda dos valores morais,[1] é as cadeias
superlotadas, gerando uma qualidade de vida sub-humana, è o ensino
público precário. Tudo isto só nos traz a lume, que a América Latina
com toda a sua riqueza è amaldiçoada, pois è grande o contraste entre
toda a riqueza que existe neste continente com a sua grande pobreza
. Vivemos em um continente de explorados, com a idéia tacanha de povo
colonizado, que perde sua identidade e seus valores em detrimento
da opressão e marginalização do estrangeiro.
A luz das crises que enfrentamos no cotidiano,
surge o movimento carismático[2] oferecendo um produto com sabor
de mel, alicerçado no pensamento apocalíptico[3]. “A sociologia que
determina o critério deste distinção, que se preocupa pelo (tarefa)
de explicar o pano de fundo social das comunidades ou indivíduos”[4]
è incapaz de estabelecer critérios para análise do movimento religioso,
pois os próprios apocalípticos fornecem pouquíssimos dados sobre suas
comunidades.
A oferta è ampla e diversificada, nela
encontra-se produto para todo e qualquer problema. O importante dessa
oferta está na sua solução, o problema è resolvido imediatamente,
isto è, Deus intervém aqui e agora. A “Batalha Espiritual” é travada,
os exércitos angelicais guerreando contra os demônios, são capazes
de dar a vitória à pessoa que tem fé. Na realidade a batalha tem aspectos
de transcendência e imanência em cada indivíduo. “Nisso reside a motivação
fundamentada para o fervor e a "guerra santa" contra todos as demais
religiões, notadamente àquelas que manipulam poderes sobrenaturais
através da magia. Identificado o inimigo, não falta motivação
para essa ‘luta’ contra a malignidade invisível e suas pretensas expressões
religiosas. Isto è suficiente para superlotar os templos todos os
dias...”[5]
A esperança apocalíptica do movimento “tornou-se
a absoluta segurança da conquista divina do bem sobre o mal”[6]. È
importante salientar que tal segurança se expressa em categorias simbólicas
temporais, com o objetivo de intensificar a certeza da manifestação
no cumprimento de suas promessas divinas.
Parece bastante provável, pois, que entre
as pessoas sábias e racionais, que proporcionariam suas crenças à
evidência, e, consequentemente, seriam levadas a não acreditar na
ocorrência de milagres.
OS MILAGRES NA RELIGIOSIDADE POPULAR
Os milagres, propriamente ditos, supostamente
aconteceram quase que exclusivamente através do testemunho de outras
pessoas e dos relatos de testemunhos oculares dos espectadores. Na
maioria das vezes, observa-se, aceitam sem maiores problemas o testemunho
e os relatos de outras pessoas, e isto porque tem-se aprendido através
da experiência que, em um grande número de casos, testemunhos e relatos
de espectadores são verdadeiros, a menos que estes tenham alguma razão
para nos enganar, ou que tenham eles próprios sido enganados.
Tem havido, pois, uma conjunção entre testemunho
humano e os fatos que estes testemunhos relatam. A experiência desta
conjunção, porém, não é uniforme, embora possa ser frequente. Pessoas,
às vezes deliberadamente, dizem mentiras, e, outras vezes, são, elas
próprias, enganadas, e, consequentemente, dão falso testemunho, embora
não intencionalmente. Como regra prática, entretanto, podemos acreditar
em testemunho humano, a menos que tenhamos razões para suspeitar que
o informante ou tenha sido enganado ou esteja tentando nos enganar.
Um evento cujo acontecimento viria violar
nossa experiência uniforme do curso da natureza é um evento miraculoso,
na terminalogia da religiosidade popular. Um evento, porém, cujo acontecimento
é raro e infrequente, mas já foi presenciado por muitos, não indo,
pois, contra a experiência uniforme do curso da natureza, podemos
chama-la de um evento extraordinário.
Se alguém vem, pois, e nos relata o acontecimento
de um evento extraordinário, mas não miraculoso, ou seja, de um evento
que raramente acontece, mas cujo acontecimento já faz parte de nossa
experiência - como, por exemplo, o fato de que alguém jovem saudável,
que aparentemente possuia saúde de ferro, faleceu de repente - a evidência
resultante do testemunho é diminuída, em grau maior ou menos, em proporção
à maior ou menor improbabilidade do fato.
A experiência nos ensina a dar um certo
valor ao testemunho de outras pessoas, mas também nos adverte contra
o inusitado, exatamente por ser inusitado. Temos, pois, aqui, um cotejo
de duas experiências que se opõem. Deve vencer a experiência da religiosidade
popular mais frequente. Se vamos ser sábios e racionais e proporcionar
nossa crença à evidência, vamos aceitar a hipótese mais provável,
e acreditar que aquele evento que temos presenciado mais frequentemente
coeteris paribus, tenha acontecido.
Se alguém nos vem relatar, porém, o acontecimento
de um evento miraculoso, i.e., de um evento que contraria a nossa
experiência uniforme do curso da natureza, ou seja, de um evento que
nunca vimos acontecer - como por exemplo, o fato de que alguém que
já esteja morto e enterrado há alguns dias está novamente vivo - não
há porque hesitar. Visto que nossa experiência nos tem mostrado, até
aqui, que isto não acontece, e também nos tem mostrado que pessoas
muitas vezes são enganadas ou tentam nos enganar, é muito mais provável
ser por algum motivo falso o que nos esteja sendo relatado dos que
haver acontecido algo sem nenhum precedente em nossa experiência.
Contra o que nos é relatado há a experiência uniforme de uma lei da
natureza. E como experiência uniforme equivale a uma prova, há aqui
uma prova direta e plena, derivada da própria natureza da situação,
contra a existência de qualquer milagre. Dai resulta a seguinte regra:
"Nenhum testemunho é suficiente para estabelecer a ocorrência de um
milagre, a menos que o testemunho seja de tal natureza que sua falsidade
seja ainda mais miraculosa do que o fato que ele procura estabelecer.
Pela sua própria natureza, milagres são
eventos "únicos", pois se deixarem de sê-los também deixarão de ser
milagres.
Sem a menor dúvida, a religiosidade popular
é o rico patrimônio dos pobres. Os movimentos messiânicos existem
no Brasil desde o período colonial, e no Nordeste do país, as manifestações
culturais populares de caráter religioso são marcantes.
Os messias ocupam sempre uma posição de
superioridade em relação aos fiéis, uma vez que o messias é o líder
no ápice e os fiéis na base, encontrando-se um grupo intermediário
a ambos, que são os discípulos mais chegados (Queiroz: 1976).
Na última década do século XIX, surgiu
o movimento de Canudos, organizado em torno de Antônio Vicente Maciel,
ou Antônio Conselheiro. Conselheiro fora acusado de heresia pela Igreja
Católica e de monarquista pelos líderes republicanos. Conselheiro
foi o principal protagonista da revolta de Canudos, no sertão da Bahia.
A prática das procissões pelos penitentes em busca de milagres tornou-se
comum no Nordeste, como as procissões durante a quaresma em Juazeiro,
Bahia, e pelos romeiros em Juazeiro do Norte, Ceará.
Os pedidos de milagres assim como as promessas
feitas demonstram a desigualdade social e as necessidades que permeiam
o cotidiano dos romeiros. Nesse caso, a falta de acesso ao sistema
de saúde, distanciamento dos bens materiais e econômicos, do lazer,
viagens e divertimento, assim como, da superficialidade de fundamento
espiritual por parte dos devotos, pois, com a entrega das preces ao
Santo, transferem para ele responsabilidades que seriam dos governantes,
e buscam através dos pedidos suprir as deficiências da realidade em
que estão inseridos. Por serem crédulos, os romeiros acreditam na
força da oração, como um meio de resolver seus problemas e de terem
direito, a outras possibilidades na vida.
Os Evangélicos crescem em estratos sociais
com perfis socioeconômicos contrastantes: enquanto a renda e a escolaridade
dos primeiros são bem inferiores à média da população, os últimos
distribuem-se nas faixas de renda e nos níveis escolares mais elevados.
Embora sua composição social não mais se restrinja aos estratos mais
pobres, os pentecostais prosseguem crescendo majoritariamente na base
da pirâmide social. Seu sucesso proselitista junto às massas pobres
resulta, em parte, de seu incansável esforço e empenho para atraí-las,
persuadi-las e recrutá-las mediante a oferta sistemática de serviços
mágico-religiosos com forte apelo popular, da realização de cultos
carregados de alto teor emocional, da propaganda pessoal e eletrônica,
difundida diuturnamente, de testemunhos bem-sucedidos de conversão
e obtenção de bênçãos. Sua ênfase pastoral e teológica na cura de
enfermos, na expulsão e libertação ritual de demônios (tidos como
responsáveis pelos infortúnios que afligem fiéis e virtuais adeptos)
e na promessa de bênçãos materiais e de milagres aos cristãos obedientes
a Deus – ênfase decorrente do propósito de resgatar, reproduzir e
disseminar crenças e práticas do cristianismo primitivo – demonstrou
ser uma receita evangelística exitosa, dada sua boa adaptação às demandas
mágico-religiosas e aos interesses materiais e ideais de parte dos
estratos pobres brasileiros e latino-americanos.
Conclusão
Os milagres é evidência em qualquer ramo
do cristianismo, tanto católicos, ortodoxos e evangélicos. Assim,
o que se perde é o elemento extraordinário e mágico, a partir do momento
em que os seguimentos religiosos teve de lutar pelo seu espaço dentro
da sociedade que se secularizava, ele deixou de ser mística e passou
a ter um papel mais secular, ou seja, é o momento do "äggiornamento"
da igreja cristã nas questões sociais; a partir de então, a mística
religiosa "rústica" tão decantada pela sociologia rural deixa de apresentar
o extraordinário e passa a ser ressemantizado pelos movimentos sociais
dirigidos pela Igreja. Neste processo a religiosidade popular é transformado,
através de uma migração simbólica, em símbolo chave da liturgia tendo
a principal função o ver, julgar e agir, no aqui e agora através dos
milagres.
BIBLIOGRAFIA
SIEPIERSKI, Paulo D., Fé Cristã e filosofia
da historia no debate atual, in Historia da igreja em debate, organizado
por Martin N. Dreher, São Paulo: Aste, 1994.
MENDONÇA, Antonio Gouvêa, Sindicato
de Mágicos: pentecostalismo e cura divina (desafio histórico para
as igrejas), in Estudos de Religião, revista de estudos e pesquisas
da religião, Ano VI, nr 08, São Paulo: IMS - EDIMS, outubro
de1992.
DROOGERS, André, Visões paradoxais de uma
religião paradoxal: modelos explicativos do crescimento
do pentecostalismo no Brasil e no Chile, in Estudos de Religião, revista
de estudos e pesquisas da religião, Ano VI, nr 08, São Paulo: IMS-EDIMS,
outubro de 1992.
BITTENCOURT FILHO, José, Remédio
Amargo, in Tempo e Presença, publicação do CEDI, nr 259, Ano 13.
BITTENCOURT FILHO, José, Remédio Amargo,
in Nem Anjos Nem Demônios, Petrópolis, Rio de Janeiro, Vozes, 1994.
WILGES, Irineu, Cultura religiosa: as religiões
no mundo, 6a. edição, Petrópolis, RJ, Vozes, 1994.
GALDINO, Florêncio, O fenômeno das seitas
fundamentalistas, Trad. José Maria de Almeida, Petrópolis-RJ: Vozes,
1994.
* Rev. Ashbell Simonton Rédua é pastor da Igreja Presbiteriana do Sinai em Niterói-RJ. --------------------------------------------------------------------------------
[1]Nos dias atuais, è comum assistir na
televisão a qualquer hora do dia ou da noite, flexes e cenas sexuais,
tudo isto em nome da pòs-modernidade.
[2] Movimento Carismático aqui defino tanto
os pentecostais, neopentecostais e o carismatismo católico romano.
[3]”A apocalìptica se refere a uma perspectiva
religiosa específica acerca dos planos divinos e últimos para a história.
Esta perspectiva,... se exprime na linguagem dos oprimidos e marginalizados,
se não na origem, pelo menos no seu propósito. Mais especificamente,
a apocalìptica è uma expressão sobrenaturalista dos aflitos em relação
às forças culturalmente opressoras de domínio... ou seus próprios
líderes mal1ignos e autônomos que são fantoches do domínio estrangeiro”.
Carriker, op.cit., pp. 05.
[4]Carriker, op. cit. pp. 04.
[5]Bittencourt, op.cit., pp.26.
[6]Carriker, op.cit., pp. 06. O autor escreve
que “a simples confiança e a absoluta segurança na conquista divina
do mal se torna a devida herança dos retos. Entretanto, tal segurança
urgente, freqüentemente se expressa por categorias temporais a fim
de intensificar a certeza de que Deus vindicaria suas promessas para
os retos. A linguagem do fim, em última análise, è a linguagem de
finalidade. O que está em jogo não è o fim próximo da história ou
da criação, mas a resolução, que está para sair, da crise histórica.
Tal perspectiva è pessimista somente em relação a ordem atual dominante
má. Em relação da esperança na resolução divina pendente, ela è realmente
otimista e confiante.”
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